Passa já da hora o vosso despertar espiritual . . . Saiba que a tua verdadeira pátria é no mundo espiritual . . . Teu objetivo aqui é adquirir luzes e bênçãos para que possas iluminar teus caminhos quando deixares esta dimensão, ascender e não ficar em trevas neste mundo de ilusão . . .   Muita Paz Saúde Luz e Amor . . . meu irmão . . . minha irmã

segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

CAPÍTULO VII Livro: Vida de Jesus ditada por Ele Mesmo O prestígio do Messias na Judéia foi devido ao Batista, que foi depois encarcerado por suas exprobrações contra os vícios da corte de Herodes e decapitado afinal por influência de Herodíades. Jesus nada pôde fazer em favor do mártir.



Meu prestígio na Judéia o devia à personalidade de João. É evidente que, a não ter sobrevindo a morte de João, Jesus não teria conseguido influenciar as massas para que o seguissem em um país onde o povo honrava o piedoso cenobita. E, por outra parte, está provado, por isso, que a celebridade de Jesus teria ficado circunscrita entre a proteção do Mestre e a terna afetuosidade de algum discípulo, se João houvesse conservado por mais tempo seu prestígio na Judéia. Mas, por efeito da vontade divina, a morte de João veio favorecer a missão de Jesus. A perda do apóstolo era fácil ele prevê-la em vista de sua estranha pregação; mas o gênero de morte que lhe impôs uma mulher escandalosamente desonrada, tornou esta perda mais cruel para os amigos do mártir.

João foi preso e encarcerado por ordem de Herodíades, que se havia casado com Herodes, por causa de um crime. Desde sua prisão, João, que podia comunicar-se com seus discípulos, mandou-me muitos dentre eles para dar-me a conhecer sua penosa situação e confiar-me o poder que tinha na Judéia. Meus apóstolos acolheram com frieza aos discípulos de João. A narração dos sucessos e a apreensão de uma sorte igual à do Mestre para mim causou-lhes estupor e despertou neles um vergonhoso egoísmo.

Desconhecendo a fraternidade da dor, desprovidos dessa elevação na fé, que mais tarde conquistaram, suplicaram-me todos que renunciasse ao encargo que João queria confiar-me e que permanecesse como um espectador neutral em uma tragédia cujo desenlace não podia ser mudado, de maneira alguma, por minha influência.

Assustado pelas conseqüências da prisão de João, desesperado pelo provável fracasso de minhas tentativas, porém resolvido a ensaiá-las e forte sobretudo pelo legado que me deixava o apóstolo de Deus, encaminhei-me com os discípulos do prisioneiro para colocar-me em condições de poder-lhe servir e para receber suas últimas instruções.

Meus apóstolos e os discípulos de João tinham a mesma fé. Porém estes, robustecidos por privações maiores, exaltados por mais fortes tensões de espírito, tinham que superar aos meus em todas as circunstâncias de extremo infortúnio e de fulminante adversidade.

A cólera de Jesus prorrompeu em amargas exprobrações. Ele chamou vis e perjuros aos maus servidores de Deus, aos que faltam à delicadeza, à honra, à amizade e predisse o abandono e o isolamento de sua alma aos que os chamaram com o medo e a fuga. Mas a cólera de Jesus tinha que acalmar-se na solidão, porque uma elevada manifestação inspirava-lhe palavras como estas:

               “Perdoa-lhes, Deus meu, porque não me conhecem. Ampara-me
                porque tu és o único forte. Defende-me contra a fadiga, contra a
                irritação, contra o desespero econsolida minha vontade que vacila.
               Tu és meu único refúgio, tu és minha única esperança”.

Jesus encontrava amplas compensações, na adorável bondade de Deus, às tristezas que invadiam seu espírito, e as más impressões desapareciam na prece.

               “Irmãos meus, o mais belo dos heroísmos humanos é o esquecimento
                de si mesmo para levar aos outros a palavra de paz e de consolo.
                “As maiores virtudes encontram-se nos caminhos dolorosos e a
                 marcha da alma para seu Criador não se realiza senão à força de
                 sacrifícios.
                “Honrai a desventura, inclinai-vos diante da miséria, fazei brotar a
                 esperança nos corações febricitantes, trabalhai com empenho em
                 servir os enfermos e abrandai seus sofrimentos; destruí o mal em
                 suas obras e esforçai-vos na libertação do justo”.

Cheguei ao lado de João com a passageira esperança de salvá-lo, mas ele afogou esta esperança dando-me as mais espantosas informações a respeito do poder que o mantinha em custódia.O que eu devia fazer, disse-me João, no interesse de nossa causa, era manter-me distanciado do centro da perseguição e continuar fazendo partidários nas classes mais ínfimas.

Fiquei a sós com João, não havendo nada em minhas aparências que pudesse causar a menor suspeita aos guardas do prisioneiro, e escutei a palavra do apóstolo inspirada já pelos resplendores, que ele entrevia, do Além, entre as sombras da morte. De joelhos, como pouco tempo antes, durante a penitência do Jordão, inclinei a cabeça diante dessa grande figura da história dos séculos. João levantou-me, abraçou-me, deu-me ânimo e fez-me prometer que seguiria seus conselhos.

Resolvido a morrer antes que renegar de suas palavras, fez-me saber assim a condição que se lhe impunha para conceder-lhe a vida e a liberdade.

                “Não vejo a hora de afastar-me da justiça dos homens e deixo-te o
                 cuidado de minha glória perante a posteridade. Filho de Deus,
                 continua minha missão. Anda depressa! Os dias estão contados e
                 nossa aliança deverá receber o prêmio na pátria celeste, depois do
                  êxito. Anda depressa!
                  A causa de Deus está em perigo e o Messias João a confia ao
                  Messias Jesus. Adora a causa de Deus que nos lançou aqui e
                  caminha para a morte com o olhar fixo no porvir.
                  No porvir, o nome de Jesus será glorificado e sua fé triunfará,
                  porque o Deus de Justiça e de amor designou-o Messias da religião
                  universal”.¹

A voz de João tomou então um tom profético, passaram-se visões diante dele e fez ressurgir em mim a segurança de minha futura elevação.

Oh fé santa! — Tu despertas a coragem e as virtudes, proporcionas o desprezo das honras e dos sofrimentos, realizas milagres de amor e de sacrifício; adquires forças e devoção; levas liberdade ao espírito e tranqüilidade aos corações. Tu és a porta da esperança, a chama da caridade, a estrela maravilhosa que brilha no céu escuro dos náufragos!

Oh! Amor de Deus santo — Tu só te manifestas à alma crente e a todo espírito forte e desligado das trevas!

Oh Deus meu! — Torna fácil a fé aos homens que leiam estas palavras e manifesta-lhes todo o teu amor!

A coragem de João não se enfraqueceu, pois ele recebeu a morte com a tranqüilidade que dá a fé.

Tendo ficado só depois da morte de João para dirigir os homens na nova crença, eu recobrei forças nas recordações das brilhantes promessas de meu amigo e reuni os princípios de sua severidade para os pecadores com uma moral cuja base era a fraternidade.

Engrandecido pela fama do solitário, segui o costume da purificação no Jordão, tomando abertamente o título de filho de Deus e deixando a João o nome de Precursor que ele havia tomado espontaneamente. Designando a habitação de meu pai no céu, apresentava esta imagem com colorido que convinha aos filhos da Terra desse tempo. Hoje não mais poderia dizer: o céu e o inferno; as portas do inferno não prevalecerão contra mim; a morte é eterna para o pecador; o Demônio o arrastará a um abismo sem fundo, e não verá jamais a Deus, porque ele o terá amaldiçoado, e porque a luz não penetrará no inferno; a luz é Deus; o Demônio reina nas trevas e o réprobo lança gritos de angústia, chamando Deus, o qual permanecerá, não obstante, eternamente surdo a eles.

Mas digo em troca:

               “Irmãos meus, o céu é uma designação vaga da morada de Deus. O
                inferno não existe. A morte é o termo de uma etapa do espírito; as
                existências sucessivas operam paulatinamente a purificação na
                natureza dos espíritos, aos quais a justiça de Deus dá a todos, por
                igual, uma manifestação confusa da verdade, a qual, palmo a palmo,
                se aperfeiçoa à medida que eles caminham na presciência do porvir,
                pelo abandono dos instintos materiais e pela pureza dos desejos”.

Meus preceitos de hoje são os mesmos de outrora, mas se apoiam sobre o ponto fundamental de uma doutrina, cuja exposição não teriam podido compreender os homens que então me rodeavam, e eu devia purificar seus espíritos sem preocupar-me dos meios. Tinha de apresentar-me como filho de Deus, porque a palavra reformador não teria sido suficiente, sendo-me de necessidade conquistar um princípio divino para elevar-me perante a posteridade, para a qual talvez tivesse passado ignorado sem este princípio.

Em minhas primeiras pregações em Jerusalém, havia certamente adiantado a negação do inferno, durante minhas demonstrações a respeito da bondade divina, mas ali me ouviam homens familiarizados já com dito pensamento, filho da própria razão. Aqui a tradição do inferno imprimia a meus discursos a tétrica energia de que as massas se manifestam sempre desejosas, e eu queria atrair para mim a confiança dessas massas. Durante minha permanência em Jerusalém havia, é certo, explicado a manifestação do espírito para com o espírito, mas aqui eu falava do espírito de Deus e do espírito das trevas, do espírito puro e do espírito impuro, da ressurreição dos corpos e da presença de Deus no julgamento de cada homem depois de morrer e insistia na minha presença à direita do Pai Celeste, quando ele vier para julgar os vivos e os mortos.

Irmãos meus, os inimigos de Jesus tiraram partido destas contradições para acusá-lo e o expediente que Jesus empregava para dominar as massas valeu-lhe que o considerassem como um ambicioso dos favores populares. Porém as provas a respeito das verdadeiras intenções de Jesus encontram-se em suas invariáveis demonstrações quanto à fraternidade e igualdade entre os homens,em sua contínua familiaridade com os mais pobres e mais desavergonhados, em sua fácil renúncia às lisonjas da carne, em seu alheamento das riquezas e da dissipação mundana, em seu modo de apresentar-se, em seus hábitos, em seu suplício, que podia evitar, e enfim, na suprema honra que recebeu de Deus ao designá-lo como vosso Messias e vosso iniciador nas novas doutrinas, em sua felicidade, suas dores, suas alegrias, sua glória.

Sabei-o, irmãos meus, a pura luz de Jesus o conduzia a estabelecer uma crença baseada na lei divina da associação fraterna dos espíritos. Mas, não era chegado ainda o tempo desta elevada demonstração e Jesus tinha que apegar-se aos únicos meios que podiam consagrar sua popularidade. Sabei-o também:

Jesus tinha como guia a inspiração dos espíritos do Senhor; apesar disso, Jesus chamava para si a inspiração mediante a emulação de sua própria vontade, e, muitas vezes, erros, cuja lembrança lhe impõe sua memória, foram cometidos, sendo sua causa o desvio de seu juízo, em circunstâncias em que somente o livre arbítrio deve governar o espírito. Manifesto-me agora com a alta proteção de Deus. No mundo terrestre também falava com a alta proteção de Deus. Entre minhas duas aparições decorrem dezenove séculos e minha filiação, assim como minhas palavras, não podem ser as mesmas.

O filho de Deus é um espírito inteligente chegado ao seu mais alto destino pelo cumprimento dos deveres traçados a todos os espíritos de sua ordem, e as palavras de Jesus aos homens dos tempos presentes têm que assinalar a distância existente entre estes e os povos da Judéia, aos quais se dirigia Jesus em sua vida corporal. Emoções de elevada significação atraíam Jesus para a família espiritual por ele merecida e ao mesmo tempo as emoções de sua vida carnal durante sua missão humana o incitam a manifestar a origem e o fim desta aos homens de hoje.

Que seria necessário para fazer desaparecer as dúvidas da grande maioria destes homens? Seria necessário repetir minhas conversações familiares de outros tempos e suas divagações nos discursos destinados a honrar a humanidade futura com a exposição dos deveres e da revelação das verdades prometidas ao homem inteligente.

Seria necessário humilhar mais ainda minha natureza e descer ao nível da manifestação dos espíritos que permanecem na atmosfera material, onde seu lugar lhes está indicado de longa data. Seria necessário oferecer pormenores sobre os acontecimentos futuros e fazer emprego vergonhoso da graça divina destinando-a a manifestações insensatas. Seria necessário obrigar a fé da Humanidade com um milagre autêntico e arrojar o relâmpago da chama sobre a revelação, da qual eu sou o mensageiro.

Expor minha opinião sobre o papel não vale nada, assim como descrever o caminho que eu segui. — Dar a penetração do porvir? — Que importância poderia ter isso para homens cuja vida se passa no desperdício da inteligência, no embrutecimento que origina o abuso da força, nos permanentes desejos ambiciosos e imorais, no grotesco desdém por tudo o que lhe recorda a fragilidade da existência presente e a pesada responsabilidade do espírito imortal, na negação de Deus e no desafio atirado à sua justiça, com abomináveis divagações e com exemplos mais abomináveis ainda, no esquecimento completo das atribuições do homem e no olvido de todo pudor, de toda delicadeza, de toda probidade, de toda honra, de todo sentimento humano?

Coloco-me ao nível intelectual do médium que escolhi; mas alguns homens de grande inteligência encontrarão fraqueza nas minhas manifestações e outros de mais modesto talento farão notar as dificuldades que surgem destas mesmas manifestações. Outros, e são os mais numerosos, me acusarão de ter enganado ao povo hebreu com ensinamentos que o animavam a abraçar uma crença que eu mesmo não tinha. A isso respondo: Em quase todas as circunstâncias de minha vida obtive minha coragem da convicção que tinha dos favores divinos, e era necessário tornar-me digno desses favores com um desprendimento completo dos gozos da família, e de toda ambição própria do homem. Tinha que sustentar lutas para chegar ao estado que eu desejava, porém a firmeza de minha fé tinha que triunfar, porque Deus era meu apoio e o prêmio a que aspirava. A misericórdia divina não me mandava para desempenhar uma missão fraternal?

E não bastava acaso a força deste pensamento para levantar-me cheio de ardor depois de um momento de depressão? Quanto aos meios para persuadir e convencer os homens, empreguei os que requeriam a situação das cousas e a inteligência de meus ouvintes. Convencido da assistência dos espíritos de Deus, não podia associar esta definição com os dogmas fundamentais da lei judaica, posto que os sacerdotes, cuja arrogância estava de acordo com seu poder, vigiavam para o fiel cumprimento da lei e estes sacerdotes me haveriam feito morrer antes da hora estabelecida, antes do cumprimento da obra, se houvesse começado demasiadamente cedo a ceifa da messe do Senhor. Tinha a convicção da assistência dos espíritos de Deus, mas ao mesmo tempo estava seguro do perigo que corria por esta revelação em uma época em que os espíritos não estavam dispostos a recebê-la, e fundei uma doutrina mais em harmonia com o desenvolvimento do espírito humano, persuadido de que mais tarde estas verdades abririam caminho. Tinha a convicção da assistência dos espíritos de Deus, porém em Jerusalém os meus amigos que tinham a minha mesma crença haviam-se recusado a sustentá-la em público. Isso não significava mais, apesar de tudo, que um rejuvenescimento de crenças! Isso, apesar de que as revelações se encontram na ordem natural das forças humanas e das forças espirituais, dos desígnios de Deus e dos caminhos abertos pela Providência! — Mas neste mundo de enganos e de falsos profetas, quantos obstáculos há que vencer-se para demonstrar a verdade! —

Quantos vícios e quantos desvarios se opõem às noções trazidas pela virtude e pela razão! — Oh! Mártires de todos os séculos que me haveis precedido! —

Oh! Mártires de todos os séculos que me haveis seguido! — Baixai das regiões em que agora vos encontrais para dizer comigo: Pobre Humanidade! — Quando, pois, chegarás a ser digna dos esforços dos que querem emancipar-te? — Quando terás a coragem de levantar-te e olhar para Deus! — De amaldiçoar a ignorância e de lançar-te para a imortalidade com fé e com amor?

Irmãos meus, a vida de Jesus tem que ser explicada por ele mesmo para desfazer as dúvidas, que existem ainda, a respeito de sua natureza e de sua sinceridade. Jesus o disse: Fui o apóstolo de João e, depois da morte do Solitário, procurei reunir os antigos preceitos com os que lhe ditava a alta sabedoria dos mundos. O amor fraterno, a solidariedade humana, a justiça e a misericórdia de Deus, tais eram os dogmas estabelecidos por Jesus. Mas, para predicar estas cousas com algum desenvolvimento, era necessário romper com os dogmas antigos, com a idéia da criação de um só mundo, a dependência da alma com relação ao inferno, a condenação eterna, o poder do demônio, as demonstrações pueris, os sacrifícios ímpios, em uma palavra, era necessário destruir e reconstruir, e não tinha eu o tempo nem os meios para levá-lo a termo.

Em minhas conversações com João tinha combinado que lançaríamos a semente no meio da gente plebéia e que o título de filho de Deus serviria para atrair as multidões no porvir, para que minha missão fosse proveitosa e imortal.

A doutrina de Jesus tinha que apoiar-se sobre o prestígio da filiação divina, com o propósito de que ela ficasse absolutamente estabelecida e religiosamente observada a fim de humilhar todas as misérias morais. Podia acaso o Messias Jesus lançar o anátema contra o poder e a crueldade dos ricos?

Não. As turbas tantas vezes enganadas pelas aparências da virtude, não teriam admitido a moral do pobre Nazareno e o teriam acusado de invejar os mesmos que ele apontava para desprezo dos adoradores de Deus. — Podia acaso o Messias Jesus lançar o anátema contra a escravidão e a justiça humana? — Não, visto que a multidão não teria compreendido a um homem que intentava derrubar as instituições até então respeitadas. Mas o que o Messias Jesus não podia intentar poderia intentá-lo o filho de Deus e o porvir recompensaria a Jesus pela derrota e contrariedades de sua vida presente. Ao filho de Deus correspondia-lhe o dizer:

              “meu reino não é deste mundo”.
               “O céu e a Terra passarão, porém não passarão minhas palavras.
              “Permanecei na paz do Senhor, caminhai dentro de suas leis e crede
               na ressurreição dos espíritos.
               “Pedi, e dar-se-vos-á, a mão de Deus não tem fim e seu amor é
                imenso.
               “Baixai até o fundo de vosso coração e arrancai dele tudo o que tenha
                de impuro. As impurezas corrompem o coração e a alma.
                “Semeai, arrancai a erva má. Eu vos digo, homens de boa vontade:
                 os que tenham semeado aqui, colherão em outra parte, Digo-vos
                 ainda: Abandonai os bens da Terra, pois que os ricos não entrarão
                 no reino de meu Pai. Mas entrarão os que tudo tiverem dado para
                  seguir-me. Mas entrarão os que tenham compreendido minhas
                   palavras e as ponham em prática”.

Eu era o enviado da justiça de meu Pai e me fazia o intérprete de sua misericórdia.

               “Vinde a mim, vós que haveis pecado, e vos perdoarei. — Vinde! — A
                liberação de vossas almas se efetuará por obra de meu amor.
                “Eu sou o bom pastor e o bom pastor dá a vida por seu rebanho.
                “Eu sou a fonte do consolo, e a meu lado não se devem temer os
                 perigos; porque Deus está em mim e eu estou nele.
                 “Sereis arrastados pelos espíritos das trevas para a morte do
                  pecado, mas eu sou a luz, a verdadeira luz até à consumação dos
                  séculos.
                 “Ide, dizia aos pecadores, ide e não pequeis mais. O Senhor vos
                  perdoa por meus lábios, porque eu sou seu filho predileto e tudo o
                  que eu perdoar na Terra será perdoado no céu.
                  “Sou o intérprete de meu Pai e do vosso, porque a pátria celeste é
                   minha pátria.
                  “Vim para trazer-vos a verdade, para que a verdade seja conhecida
                   de todos os homens no presente e no porvir.
                   “Deus conhece vossos mais secretos pensamentos. Rogai pois
                   com pureza de coração para que vossas orações sejam ouvidas.
                   “Praticai o bem ocultamente e que não saiba a tua mão esquerda o
                    que dá a tua direita.
                    “Não imiteis os hipócritas que levantam os olhos ao céu e têm um
                     rosto esquálido, para demonstrar a todos que oram e que jejuam.
                    “Porém quando fordes à Sinagoga, tomai uma atitude modesta e
                     entrai com a alma livre de toda a venalidade e desligado de todo
                     rancor.
                    “Quando derdes expansão a vosso espírito e a vosso corpo com o
                      descanso e em meio das distrações, fazei-vos fortes contra tudo
                     o que seja baixo e grosseiro, porque isso desenvolveria em vós as
                     tendências bestiais e faria retroceder vosso espírito.
                    “Quando vos encontreis em aflição, dizei: Deus meu! Seja feita tua
                     vontade e não a minha. Em seguida Deus vos mandará a alegria
                     e a força.
                     “Quando vos encontreis na abundância, distribuí o necessário aos
                     que não o tenham e quando vos encontreis na necessidade
                     recorrei a vossos irmãos. Todos os homens são irmãos e Deus
                    lhes disse: Amai-vos uns aos outros e amai-me sobre todas as
                    cousas”.

Minhas preferências me levavam às reuniões populares e com freqüência a curiosidade que acompanhava minha pessoa, alterava minhas palavras arrojando-as às paixões entusiastas dos amigos do maravilhoso.

Meus inimigos tomavam nota do ruído que se fazia em torno de meus milagres e mais tarde acusaram-me de haver deixado que se acreditasse nestes milagres por não tê-los negado em sua mais insignificante parte.

Minha natureza de filho de Deus, irmãos meus, é para vós matéria de estudo e tenho que vô-la definir completamente. Porém vou antes explicar-vos dois milagres referidos em vossos livros, e, se os prefiro, é por encontrá-los de uma inventiva mais exagerada que os demais.

Na cidade de Jericó um cego encontrou-se no caminho de Jesus e começou a clamar: Jesus filho de Deus faz que me seja dada a vista.

Jesus lhe disse: Te é restituída a vista e ele viu.

Irmãos meus, o cego de Jericó é uma quimera.

O homem enfermo encontrava sempre em mim consolos e também alguns meios de alívio, devidos a meus estudos sobre as enfermidades humanas. Destes milagres eu não tive conhecimento senão pelo que escreveram vossos historiógrafos.

A história dos cinco peixes e dos dois pães multiplicados e distribuídos entre muitos milhares de homens deixou perplexo meu espírito ao ver tão grande insensatez humana.

Ah! — Irmãos meus, Jesus, como acabo de dizer, encontrou-se com freqüência no meio de reuniões populares, porém jamais houve algo de sua parte que pudesse dar lugar a semelhantes fábulas. Com que objetivo teria provocado a crença nestes transtornos da natureza material, ao passo que dizia que o poder do Pai residia no esplendor da criação e nas inexoráveis leis naturais da matéria?

No princípio deste livro referi-vos a ressurreição de uma menina, ressurreição que somente existiu na imaginação dos assistentes, mas que eu deixei passar como um fato real porque não via então inconveniente algum nisto. A menina não havia tornado à vida, eu o sabia, porém aproveitei-me da ilusão dos pais para inspirar-lhes a fé na ressurreição do espírito. Porém quanto ao que sucedeu em Jericó e em todas as circunstâncias em que se me faz aparecer como violando as leis da existência material, insisto em minha negação absoluta a respeito de minha participação em tais mentiras.

Insisto nestes princípios de alta filosofia religiosa: que Deus não transpôs jamais os limites fixados por ele mesmo; que Deus não concedeu a ninguém a faculdade de transgredir as leis divinas, as quais repousam sobre leis imutáveis, que Deus é um ser demasiadamente perfeito para enganar-se, demasiado justo para favorecer uns e deixar os outros de lado, demasiado adorável para baixar a combinações do gênero das que se encontram a cada passo em vossos pretendidos livros sagrados. — Oh! Certamente Deus me protegeu! — Sim. Deus me conduziu para o porvir para que fosse a luz e o guia; porém nem sempre fui digno dessa honra, e é porque cheguei a sê-lo que pude preceder à Humanidade, em seguida baixar desde essa luz até a Humanidade para abençoá-la com meu sangue e emancipá-la com minhas palavras.

Será também filho de Deus o homem que saboreia a paz no meio da tristeza e dos sofrimentos, porque ele é livre de pensar, livre de adorar a Deus, livre de levar alívio a seus irmãos com a força do espírito e a efusão do coração, porque ele é livre de viver sem apostatar de sua fé e de morrer confessando-a, livre de caminhar para a frente durante a vida e depois da morte.

Será também filha de Deus a mulher da Terra que tenha sofrido todas as desilusões com dignidade, que tenha defendido todos os seus direitos com a consciência de seu valor espiritual, que tenha subido os degraus da ciência divina e multiplicado suas boas ações para oferecê-las ao Deus do Universo.

Será filha de Deus e poderá conservar este nome tanto perante o mundo que haja deixado, quanto perante o mundo para o qual tenha sido chamada pela vontade divina. Desejava eu com demasiado ardor a felicidade dos homens e era demasiado absoluto em meus propósitos para justificar a opinião dos que empregam com excessivo rigor o qualificativo de impostor ou dos que dissimulam o propósito desta injúria com expressões mais favoráveis para a leitura de seus livros.

Tomando o nome de filho de Deus, sabia que tinha o direito de fazê-lo: adiantando-me para o abismo, sabia que tinha caído nele. Era-me agradável a amargura da morte, como homem obrigado a morrer, e predizia a meus apóstolos o abandono de que mais tarde se fizeram culpados. Pedia forças à minha elevada proteção espiritual e em minhas alianças humanas descia a fraquezas comuns a todos os homens. Minha natureza era, pois, como todas as naturezas humanas, dividida entre a atração da Divina Providência e a atração das alegrias humanas, porém o progresso de meus pensamentos, cada vez melhor e mais intensamente dirigidos para o horizonte celeste, tinha que destruir minhas tendências corporais, convertendo-me no Messias imortal.

O homem desvinculado dos estorvos mundanos, é realmente o filho de Deus. João o havia dito antes que eu, e ele não tinha só em vista o porvir conquistado, quando me fez prometer que respeitaria minha denominação, e de sustentá-la perante todos e contra todos.

Minha posição de filho de Deus, irmãos meus, é mais compreensível para os adeptos da religião universal² que para as almas enclausuradas no círculo estreito de uma religião humana.

A religião universal funda-se na Justiça de Deus, não levanta templos para uma fração de homens, não tem cultos externos forçados; porém dá a paz depois da oração, porque a oração está despida de todas as superstições que acompanham as religiões humanas.

A religião universal define Deus com seus atributos de grandeza e de poder; as religiões humanas definem Deus com as fraquezas inerentes à Humanidade.

A religião universal tem sua base na alma, como em um santuário. As religiões humanas estão condenadas ao erro e à ascensão da razão.

A religião universal manifesta-se com elevação nos pensamentos e o desejo de perfeição. As religiões humanas exigem a fé sem proporcionar o sentimento da fé. Elas acabam por converter o homem em fanático e incrédulo.

A religião universal, irmãos meus, vos diz que todos somos iguais, em virtude de nossa origem. A religião universal vos eleva no porvir e vos defende contra o orgulho, falando-vos do passado.

A religião universal vos dá a definição exata de vosso ser e vos salva do desespero, vos inicia na glória de vosso Deus e vos promete alegrias em sua casa.

A casa de Deus é a casa das inteligências que tenham alcançado a perfeição e o apogeu. É a pátria do filho de Deus. Dali vem Jesus neste momento para explicar-vos sua natureza. Dali baixou em um dia de misericórdia, para ser Messias, vosso guia e consolador. Dali também vos abençoa todas as vezes que vossos olhares pedem a luz de Deus para mandar-vô-la. Dali também vos chama a todos, sim a todos, uns depois dos outros.

Eis o céu, o porvir da religião universal, eis a manhã deliciosa de vossa noite atual, o fim de vossos esforços, o trabalho de vossa existência. Conquistar a luz, conquistar um lugar no sol dos sóis, uma voz no concerto das harmonias divinas, conquistar a perfeição do espírito e não baixar das altas regiões senão para ajudar as almas débeis, libertar as almas escravas, senão para demonstrar aos ignorantes a grandeza de Deus e o elevado destino do espírito.

Ah, irmãos meus! — Merecei esta ventura e recreai vossa alma com esta esperança.

Durante vários séculos, depois da última humilhação de seu espírito, Jesus assistiu aos procedimentos contrários a toda lei divina dos depositários da autoridade religiosa e se não impediu esses excessos é porque Deus deixa a cada um a responsabilidade de suas ações perante a justiça, é porque Deus confirma suas leis não intervindo no exercício da liberdade individual. As forças ocultas podem bem sacudir um mundo, os Messias e os agentes superiores da autoridade divina podem bem ser os mensageiros de luz, porém a luta é sempre rude e a matéria resulta a mais forte. A materialidade apaga o sentimento de espiritualidade nos mundos inferiores, do mesmo modo que a espiritualidade apaga a materialidade nas altas regiões. Por todas estas razões não pôde pôr freio ao comércio que se fazia de sua doutrina e teve que ouvir suas falsas definições, contemplar os delitos e as abomináveis vinganças, com a alma imobilizada pela vontade divina.

Irmãos meus, meus queridos irmãos, bendizei o pensamento misericordioso que me manda novamente entre vós.

Não indagueis a Deus seus segredos, mas aproximai-vos ao fogo de seu amor, ao fulgor de sua luz, à inteligência de sua natureza e desprendei-vos o mais possível das tendências da natureza carnal.

A natureza carnal arrasta-vos para amores desonestos, a ambições abjetas, a intentos deleitosos, a demonstrações hipócritas, a alegrias humilhantes para a alma e à perda de vossa dignidade espiritual. Homem como vós outros, eu também estive submetido às leis da matéria e venho dizer-vos que Deus quer a posse de vossa alma toda inteira. Acumulai tesouros para o porvir em Deus e desprezai as riquezas terrenas. Destruí vossa ambição pelas honras humanas e merecei as celestes. Começai a reforma de vossos prazeres depravados, de vossos hábitos licenciosos, destronai o orgulho e o egoísmo para fazer resplandecer a modéstia e a caridade. Adorai a Deus, como a luz e a liberdade, como a calma e a força, a inteligência e a pureza, e não o insulteis mais com orações feitas sem a compreensão de seus predicados, que querem a liberdade, a calma, a força, a inteligência e a pureza de vossos desejos, de vosso amor, de vossa fé e de vossa esperança.

Permanecei na paz comigo, vós que quereis seguir-me e pronunciai com a efusão de vosso coração a prece que vos vou ditar para terminar este capítulo:

                    “Deus meu, faze que este mundo se me represente tal como é
                     realmente: um lugar de provações, um fardo doloroso, uma
                     habitação fria e temporária; mas abranda as amarguras da prova,
                     alivia o fardo, com o concurso das almas irmãs da minha, e
                     descobre a meus olhares o quadro deslumbrante das faustosas
                     recompensas, devidas à eterna gravitação dos espíritos, para
                     conquistar a espiritualidade pura em tua auréola e em tua glória”.

Em meu oitavo capítulo começarei a tratar da questão da dependência dos espíritos da Terra e de sua desmaterialização.

¹ A “Religião Universal” deve ser a aspiração, no sentido religioso, de todos os homens
de espírito progressista e independente. Jesus deu-nos já sua fórmula imortal com as palavras: “Ama a Deus sobre todas as coisas e a teu próximo como a ti mesmo”. Nada
melhor nos ditou depois nenhuma doutrina. — Nota do Sr. Rebaudi

² Muito me agrada esta expressão de religião universal, e em minha longa, ainda que modestíssima atuação dentro da forma nova de evolução do espiritualismo, me hei esforçado sempre por permanecer desligado de tudo o que possa parecer estreiteza de círculo, escola ou religião (grifo as palavras porque são as mesmas por mim repetidas mil vezes em artigos, conferências e discursos sempre modestos, sempre sem pretensões, porém sempre cheios de sinceridade). Certamente não é este o caminho para se encontrar lisonjas para a própria vaidade, defeito com o qual não tenho que lutar pois uma pessoa encontra-se sempre escassamente acompanhada e poucos se manifestam dispostos a prodigalizar um pequeno elogio aos esforços que fazem os que não são do seu credo; porém eu já me acostumei a encontrar-me entre as minorias, embora muitas vezes acompanhado por maiorias envergonhadas, digo mal, quero dizer maiorias prudentes, que temem que as precipitações produzam mal em lugar do bem que eles desejam. Eu penso de forma diferente, creio que é tempo de entrarmos inteiramente no que Jesus chama RELIGIÃO UNIVERSAL e encontro-me no mais perfeito acordo com o Sr. Fauvety pela campanha que há bastantes anos leva por diante com seu periódico intitulado justamente A RELIGIÃO UNIVERSAL. Por isso também agrada-me a denominação Moderno ESPIRITUALISMO, que emprega a Revista Magnetológica e a Sociedade Científica de Estudos Psíquicos da qual é órgão, pois seu significado parece bastante amplo e liberal para que possa servir de bandeira a um exclusivismo qualquer. — Nota do Sr. Rebaudi.


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